domingo, outubro 29, 2006

Eterno (Carlos Drummond de Andrade)

E como ficou chato ser moderno.
Agora serei eterno.

Eterno! Eterno!
O Padre Eterno,
a vida eterna,
o fogo eterno.

(Le silence éternel de ces espaces infinis m'effraie.)

— O que é eterno, Yayá Lindinha?
— Ingrato! é o amor que te tenho.

Eternalidade eternite eternaltivamente
eternuávamos
eternissíssimo

A cada instante se criam novas categorias do eterno.

Eterna é a flor que se fana
se soube florir
é o menino recém-nascido
antes que lhe dêem nome e lhe comuniquem o sentimento do efêmero
é o gesto de enlaçar e beijar
na visita do amor às almas
eterno é tudo aquilo que vive uma fração de segundo
mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma
[força o resgata
é minha mãe em mim que a estou pensando
de tanto que a perdi de não pensá-la
é o que se pensa em nós se estamos loucos
é tudo que passou, porque passou
é tudo que não passa, pois não houve
eternas as palavras, eternos os pensamentos; e
[passageiras as obras.
Eterno, mas até quando? é esse marulho em nós de um
[mar profundo.
Naufragamos sem praia; e na solidão dos botos
[afundamos.
É tentação a vertigem; e também a pirueta dos ébrios.
Eternos! Eternos, miseravelmente.
O relógio no pulso é nosso confidente.

Mas eu não quero ser senão eterno.
Que os séculos apodreçam e não reste mais do que uma
[essênciaou nem isso.
E que eu desapareça mas fique este chão varrido onde
[pousou uma sombra
e que não fique o chão nem fique a sombra
mas que a precisão urgente de ser eterno bóie como uma
[esponja no caos
e entre oceanos de nada
gere um ritmo.

sexta-feira, outubro 27, 2006

Ver para crer...

O Papa chegou ao Brasil em missão não oficial e trouxe um motorista negro.
Ele tinha um compromisso e estava atrasado e o negro não passava de 80 km/h e toda hora o Papa falava pro negro andar mais rápido e nada...
Ele continuava nos 80 km/h; ai o Papa disse:
- Deixe que eu mesmo irei dirigir, e foi; o negro ficou no banco de trás e o próprio Papa foi dirigindo a 140 km/h, quando um guarda rodoviário mandou o Papa parar e, quando viu quem era, resolveu passar um rádio pro chefe dizendo:
- Chefe, peguei um cara importante voando na Dutra.
- Quem é... um deputado? Perguntou o chefe.
- Não chefe, é mais importante
- É um senador?
- Não chefe, é mais importante ainda.
- Então é um governador de Estado.
- Que nada chefe, é mais importante ainda.
- Então só pode ser o próprio Presidente.
- É mais importante que o próprio Presidente.
- PUXA, nesse caso então só pode ser o Papa.
- Que nada chefe. O Papa é o motorista dele.
É o próprio São Benedito... em pessoa...

(nada como uma piadinha para alegrar o final de semana!)

quinta-feira, outubro 26, 2006

Poemeto para ser lido de cima para baixo e de baixo para cima...

Não te amo mais!
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis
Tenho certeza que
Nada foi em vão
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada
Não poderia dizer mais que
Alimento um grande amor
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
Eu te amo!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...

(Esse poema circula como sendo de autoria de Clarice Lispector, mas não o é. Desconheço o autor.)

sábado, outubro 14, 2006

Certeza (Fernando Sabino)

De tudo ficaram três coisas:
a certeza de que estamos sempre começando...
a certeza de que é preciso continuar...
a certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...

Façamos da interrupção um caminho novo...
Da queda, um passo de dança...
Do medo, uma escada...
Do sonho, uma ponte...
Da procura, um encontro.

sábado, outubro 07, 2006

Aquele casal (Carlos Drummond de Andrade)

Aquele casal, o marido me honra com suas confidências:
- Ultimamente, a Elsa anda um pouco estranha. Não sei o que é, mas não me agrada a sua evolução.
- Como assim?
- Deu para usar estampados berrantes, de mau gosto, ela que era tão discreta no vestir.
- É a moda.
- Pode ser o que você quiser, porém minha mulher jamais se permitiu esses desfrutes.
- Deixe Dona Elsa ser elegante. Não há desfrute em seguir o figurino.
- Se fosse só o figurino. São as maneiras, os gestos.
- Que é que tem as maneiras, os gestos?
- A Elsa parece uma menina de quinze anos. Ficou com os movimentos mais leves, um ar desembaraçado que ela não tinha, e que não vai bem com uma senhora casada.
- Posso dar opinião? As senhoras casadas não perdem a condição feminina, e pode até realçá-la por uma graça experiente.
Fixou-me suspeitoso:
- Que é que está insinuando?
- Nada. A mulher casada desabrochou, não é mais um projeto, pode revelar melhor o encanto natural da personalidade.
- Pois fique com suas teorias, que eu não quero saber de minha mulher revelar seu encanto a ninguém.
- Perdão, eu...
- Já sei. Estava querendo desculpar a Elsa.
- Desculpar de quê?
- De tudo que ela vem fazendo.
- Eu ignoro tudo, e adivinho que não há nada senão...
- Senão o quê?
- Aquilo que o dicionário chama de ente de razão, uma fantasia completamente destituída de razão.
- Acha então que estou maluco?
- Acho que está sonhando coisas.
- E a flor que ela trouxe ontem para a casa é sonho? Me diga: é sonho?
- Que é que tem trazer uma flor para casa?
- Veio do oculista e trouxe uma rosa. Acha direito?
- Por que não?
- Eu apertei, ela me disse que foi o oculista que deu a ela. Estava num vaso, ela achou bonita, ele deu.
- E daí?
- Então uma senhora casada vai ao oculista e o oculista lhe dá uma rosa? Que lhe parece? - Que ele é gentil, apenas.
- Pois eu não vou nessa gentileza de oculista. Não há rosas nos consultórios de oftalmologia. E que houvesse. Tem propósito uma coisa dessas? Ela acabou chorando, dizendo que eu sou um bruto, um rinoceronte. Engraçado. Minha mulher vem com uma rosa para casa, uma rosa dada por um homem, e eu não devo achar ruim, eu tenho que achar muito natural.
- Desde quando é proibido uma senhora ganhar flor de uma pessoa atenciosa? Que sentido erótico tem isso?
- Tem muito. Principalmente se é rosa. Ora, não tente negar o significado das ordens florais entre dois sexos. O oculista não podia dar essa flor, nem ela podia aceitar. O pior é que não deve ter sido o oculista.
- Quem foi, então?
- Sei lá. Numa cidade do tamanho do Rio, posso saber quem deu uma rosa a minha mulher?
- Vai ver que ela comprou na loja de flores da esquina, e disse aquilo só para fazer charminho.
- Ela nunca fez isso. Se fez agora, foi para preparar terreno, quando chegar aqui uma corbelha de antúrios e hibiscos.
- Não diga uma coisa dessas.
- Digo o que penso. Estou inteiramente lúcido, só me conduzo pelo raciocínio. Repare no encadeamento: os vestidos modernos; os modos (só vendo a maneira dela se sentar no sofá); a rosa, que ela foi correndo levar para a mesinha de cabeceira do quarto. Cada uma dessas coisas é um indício; reunidas, são a evidência.
- Permita que eu discorde.
- Discorda sem argumentos. A Elsa não é mais a Elsa. Demora mais tempo no espelho. Fica olhando um ponto no espaço, abstrata. Depois, sorri. Estou decidido.
- A quê?
- Vou segui-la daqui por diante. Contrato um detetive. E logo que tenha a prova, me desquito.
- Não vai ter prova nenhuma, juro. Ponho a mão no fogo por Dona Elsa.
- Pensei que você fosse meu amigo. Fiz mal em me abrir. Vamos mudar de assunto que ela vem chegando. Mas repare só que os olhos de Capitu que ela tem, eu nunca havia reparado nisso!

Esquecia-me de dizer que meu amigo tem 82 anos, e Dona Elsa, 79.

quinta-feira, outubro 05, 2006

Crise da meia-idade

Quando eu completei 25 anos de casado, olhei para minha mulher e disse:
- "Querida, há 25 anos atrás nós tínhamos um fusquinha, um apartamento caindo aos pedaços, dormíamos em um sofá-cama e víamos televisão em uma TV de 14 polegadas, mas todas as noites eu dormia com uma morena gostosa de 25 anos. Agora nós temos uma mansão, dois carrões, uma cama super king size e uma TV de plasma de 50 polegadas, mas eu estou dormindo com uma velha de 50 anos. Parece-me que você é a única que não está evoluindo."

Minha mulher, que é uma mulher muito sensata, disse-me então para sair de casa e achar uma morena de 25 anos de idade, pois, se isso acontecesse, ela, com o maior prazer, facilmente faria com que, novamente, eu vivesse em um apartamento caindo aos pedaços, dormisse em um sofá-cama e não dirigisse nada mais que um fusquinha.

Essas mulheres mais maduras não são demais? Elas realmente sabem como resolver sua crise de meia idade!

(Desconheço o autor)

terça-feira, outubro 03, 2006

Tocando em frente

Composição: Almir Sater e Renato Teixeira

Ando devagar porque já tive pressa
e levo esse sorriso porque já chorei demais
Hoje me sinto mais forte, mais feliz quem sabe
Só levo a certeza de que muito pouco eu sei, ou nada sei..

Conhecer as manhas e as manhãs
o sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir

Penso que cumprir a vida seja simplesmente
compreender a marcha ir tocando em frente
como um velho boiadeiro levando a boiada
eu vou tocando os dias
pela longa estrada eu vou,
estrada eu sou

Conhecer as manhas e as manhãs
o sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir

Todo mundo ama um dia, todo mundo chora
Um dia a gente chega no outro vai embora
cada um de nós compõe a sua história
cada ser em si carrega o dom de ser capaz
e ser feliz

Conhecer as manhas e as manhãs
o sabor das massas e das maçãs
É preciso amor pra poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
É preciso a chuva para florir

Ando devagar porque já tive pressa
levo esse sorriso porque já chorei demais
cada um de nós compõe a sua história
cada ser em si carrega o dom de ser capaz
de ser feliz